Câmara valida proposta para estabelecer a Política Nacional de Cuidados

A Câmera dos Deputados aprovou um projeto de lei na terça-feira (12) que institui a Política Nacional de Cuidados com a intenção de assegurar o direito ao cuidado tanto para os que recebem quanto para os que prestam cuidado. A proposta será encaminhada ao Senado.

Substitutivo e Prioridades

O texto aprovado é um substitutivo proposto pela relatora, deputada Benedita da Silva (PT-RJ), ao Projeto de Lei 5791/19, que foi originalmente apresentado pela deputada licenciada Leandre (PR). A relatora utilizou como base o PL 2762/24, do Poder Executivo, e identificou um público prioritário para essa política.

Conforme o documento, o governo federal deverá elaborar um plano nacional de cuidados, incluindo ações, metas, indicadores, período de vigência e outros detalhes, a ser executado por diversos setores governamentais, abrangendo assistência social, saúde, educação, mobilidade, previdência social, direitos humanos e políticas voltadas para as mulheres.

Garantia de Direitos e Corresponsabilização

O plano também deverá assegurar direitos para pessoas que cuidam de outras de forma não remunerada, integrando serviços de cuidado e assegurando a supervisão de serviços públicos e privados.

Além disso, poderão ser implementadas iniciativas para a formação e qualificação de cuidadores não remunerados, incluindo estratégias que promovam a parentalidade positiva.

Com o intuito de reduzir a carga de trabalho que atualmente recai sobre as mulheres, o texto prevê a adoção de medidas que promovam a corresponsabilização de outros familiares, especialmente homens. Isso poderá ser feito por meio de políticas públicas que busquem transformar culturalmente as obrigações dos cuidadores.

Simultaneamente, o plano poderá estimular iniciativas nos setores público e privado para facilitar a conciliação entre trabalho remunerado e as necessidades pessoais e familiares do cuidador.

Benedita da Silva enfatiza que garantir os direitos das pessoas que precisam de cuidados não deve implicar na perda de direitos dos cuidadores. As novas configurações familiares, aliadas às demandas do mercado de trabalho, requerem que as políticas públicas sejam reevaluadas para incorporar abordagens inovadoras de cuidado, assegurando que as necessidades de cuidado sejam atendidas de forma adequada em todas as fases da vida, afirmou.

A deputada também observou que as mudanças nas dinâmicas familiares nas últimas décadas impactaram significativamente a disponibilidade de cuidadores informais, que tradicionalmente eram membros da família, em especial mulheres e, predominantemente, mulheres negras. A diminuição do número de filhos e o aumento da participação das mulheres no mercado de trabalho contribuíram para a redução dos recursos familiares disponíveis para oferecer cuidados contínuos a familiares que necessitam de assistência, destacou Benedita da Silva, referindo-se a crianças e pessoas idosas ou com deficiência.

Participação dos Estados e Municípios

A Política Nacional de Cuidados é uma responsabilidade do Estado, e, portanto, estados e municípios poderão estabelecer suas próprias políticas em colaboração com a participação da sociedade civil, do setor privado e das famílias.

O texto de Benedita da Silva prevê que a União incentivará a adesão de estados e municípios ao cumprimento dos direitos das pessoas que recebem e proporcionam cuidados, através de uma abordagem que integre diversos setores.

O governo federal também oferecerá suporte técnico na formulação de planos por esses entes federativos, atuando via convênios para implementar projetos na área.

Entre os objetivos elencados pelo projeto para a Política Nacional de Cuidados, destacam-se:

Diretrizes e Princípios

As diretrizes da Política Nacional de Cuidados incluem garantir a participação da sociedade na construção das políticas públicas de cuidados e seu controle social; a simultaneidade na oferta dos serviços para quem cuida e para quem é cuidado; a descentralização dos serviços públicos relacionados ao cuidado; e a formação contínua para servidores públicos e prestadores de serviço na rede de cuidados.

No que se refere aos princípios, o texto menciona a equidade e a não discriminação; o antirracismo; o anticapacitismo; o anti-idadismo; e a interdependência entre os cuidadores e aqueles que recebem cuidados.

Financiamento e Trabalho Não Remunerado

Sobre o financiamento dessas iniciativas, o projeto sugere a utilização do orçamento de órgãos e entidades da administração federal envolvidas no Plano Nacional de Cuidados; recursos de entes federativos que se adequarem; doações e outras fontes, sejam nacionais ou internacionais.

Conforme a Organização Internacional do Trabalho (OIT), 16,4 bilhões de horas diárias são dedicadas ao trabalho de cuidado não remunerado, uma realidade que afeta tanto países em desenvolvimento quanto os que são considerados desenvolvidos, que lidam com a ausência de políticas públicas adequadas.

No Brasil, dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua de 2022 (PNAD-C 2022) indicam que, em média, são gastos 17 horas semanais em afazeres domésticos e/ou cuidado com outras pessoas, sendo que as mulheres despendem quase o dobro do tempo em comparação aos homens. A responsabilidade pelo cuidado geralmente recai sobre as mulheres da família do dependente, mais frequentemente mães, esposas ou filhas, o que frequentemente dificulta sua inserção no mercado de trabalho, apontou Benedita da Silva.

A deputada Soraya Santos (PL-RJ) ressalta a importância de se ter em consideração aqueles que são impossibilitados de trabalhar devido à necessidade de cuidar de alguém. Devemos garantir que essas pessoas tenham a dignidade da sobrevivência, afirmou.

Segundo o deputado Tarcísio Motta (Psol-RJ), o cuidado deve ser visto como uma responsabilidade coletiva. É comum estabelecer redes de cuidado para famílias que mais necessitam, comentou, mencionando a experiência de sua mãe que cuidou de crianças de outras mães para que elas pudessem trabalhar.

Implementar políticas públicas de cuidado para todas as pessoas, especialmente para as mulheres, é um desafio que se apresenta para o século 21, conforme a deputada Jack Rocha (PT-ES). Hoje, a Câmara aponta um caminho para que o Brasil reconheça milhares de pessoas invisibilizadas pela falta de políticas públicas, acolhimento, assistência e orçamento, concluiu.

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