Na visão de Joaquim Muniz, integrante da Comissão de Direito Empresarial do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), os escritórios de advocacia têm refletido a sociedade em relação ao envelhecimento da população. Ele ressaltou: “Vamos ter, daqui a 20, 30 anos, mais aposentados ou pessoas em idade de aposentadoria do que jovens.” Durante o evento “Diversidade geracional e Direito Empresarial” realizado na segunda-feira (7/10), Muniz afirmou que o Brasil está se aproximando do fim do “ônus demográfico”, com um aumento significativo na idade média da população, o que terá reflexos diretos na prática da advocacia.
Transformações nas equipes jurídicas
Muniz ilustrou a variação na composição etária das equipes de advogados em seu próprio escritório. Em 2014, de 400 advogados, 218 estavam na faixa de 18 a 29 anos. “Atualmente, em 2024, entre 500 advogados, apenas 135 se encontram nessa faixa etária”, destacou.
Na abertura do evento, Érica Guerra, presidente da Comissão de Direito Empresarial do IAB, enfatizou a importância dos profissionais do Direito discutirem o passado, presente e futuro de suas áreas de atuação. “Reunimos aqui pessoas que atuam e também as que já atuaram porque, nós, operadores do Direito, temos esse privilégio de sermos ativos até o fim. Esse é um espaço onde várias gerações podem dialogar, mostrando que essa discussão é tanto possível quanto necessária”, afirmou a advogada.
Desafios da diversidade geracional
O evento contou ainda com a participação dos membros da Comissão, como Antônio Carlos Torres, Jeanne Machado, José Gabriel de Almeida e Teresa Cristina Pantoja, além de João Manoel de Lima Junior, o 3º vice-presidente do grupo, e da graduanda em Direito na Fundação Getúlio Vargas (FGV/Rio), Laura Oliboni. Marina Copola, diretora da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), também fez parte do evento.
Teresa Pantoja abordou os desafios da convivência profissional entre advogados mais jovens e os mais experientes. Ela citou a velocidade nas tomadas de decisões, em que os jovens tendem a agir de forma apressada. “As novas gerações apresentam dificuldades em manter o foco na leitura; observamos uma flutuação nas atenções. Eles preferem uma visão direta da realidade, embora esta condição possa ser irreversível”, disse Pantoja, que é professora e convive com estudantes de Direito.
Em sua palestra, Antônio Carlos Torres discutiu a convivência entre diferentes gerações nas profissões jurídicas, afirmando que este desafio é um aspecto inerente à vida humana. No entanto, ressaltou que, no cenário do Direito Empresarial, as mudanças têm sido inevitáveis: “Sozinhos, não conseguimos avançar; precisamos de alguém que nos ajude. O Direito Empresarial é incessante e inevitável, pois ele se reconstitui continuamente, muitas vezes em resposta a eventos desastrosos, como guerras”.
A importância da legislação estável
Marina Copola, em sua apresentação, destacou o papel da estabilidade legislativa no mercado de capitais brasileiro, cujas leis existem há quase 50 anos e mostraram resiliência em épocas de crise, como a de 2008. “Embora essa crise tenha nos afetado severamente, nosso arcabouço legal demonstrou sua força”, comentou. Copola também expressou a dificuldade em equilibrar a necessidade de preservar qualidades desse sistema consolidado com a urgente demanda por inovação. “Estamos em uma fase de sofisticação legal e regulatória, mas o grande desafio é valorizar as virtudes do sistema sem fechar as portas às mudanças”, finalizou.
Jeanne Machado, ao analisar as transformações no setor ao longo das últimas décadas, ressaltou que a Constituição de 1988 revolucionou o Direito Empresarial, introduzindo novos princípios, como a valorização do trabalho humano e a livre iniciativa. Além disso, trouxe questões que requerem equilíbrio, como a função social da propriedade e a proteção ambiental. “A expressão ‘negócios são negócios’ já não é mais suficiente diante dessas exigências contemporâneas”, mencionou.
Necessidade de adaptação dos advogados
Outra questão discutida por Machado foi a governança corporativa e a relevância de práticas de transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade empresarial. “O Direito é dinâmico, acompanhando a evolução da sociedade. Os gestores devem cuidar da sustentabilidade das empresas, incorporando preocupações sociais e ambientais”, reiterou a advogada.
Laura Oliboni também defendeu a necessidade dos advogados se adaptarem às exigências do futuro: “Não é mais suficiente que um operador do Direito detenha apenas conhecimento tradicional; o advogado de amanhã precisa compreender tecnologia, gestão, lidar com pessoas e desenvolver competências socioemocionais.” Segundo ela, essas características aproximarão os advogados de seus clientes, dando um retorno positivo para essa relação. “É essencial falar a mesma linguagem de quem se defende”, disse a estudante.
João Manoel de Lima Junior, com foco na proposta de reforma do Código Civil em 2024, criticou a incessante alteração das leis, argumentando que mais de 50% da versão atual já foi modificada. Ele destacou que essa repetição de erros evidencia que os juristas frequentemente se concentram demais na prática empresarial: “Talvez não estejamos mais pensando como intelectuais que buscam contribuir com a sociedade.” Para Lima, perpetuar tal erro compromete o funcionamento adequado do sistema jurídico nacional. “Estamos sempre mudando com a expectativa de obter segurança jurídica, mas, na verdade, estamos gerando insegurança”, concluiu.
Por fim, José Gabriel Assis de Almeida criticou a percepção de que a legislação poderia resolver todos os problemas sociais. “Se isso fosse verdade, com as mais de 14 mil leis existentes, o Brasil seria uma fusão de Luxemburgo, Suécia e um toque de Singapura”, ironizou. Ele enfatizou que o Direito Empresarial moderno não se limita à busca pelo lucro, sendo necessário considerar o conceito de risco e mercado no surgimento de novas formas societárias, sugerindo que o Direito deve evoluir para se alinhar às novas realidades sociais e econômicas.