Juízes podem mudar a competência apenas em ações após nova lei

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que as disposições introduzidas pela Lei 14.879/2024, que modificou os parágrafos 1º e 5º do artigo 63 do Código de Processo Civil (CPC), aplicar-se-ão apenas aos processos que forem iniciados após a sua entrada em vigor. A nova legislação limita a opção de alteração de competência relativa através da escolha de foro e permite que o juiz determine a incompetência de ofício quando a demanda for ajuizada em foro escolhido aleatoriamente pelas partes.

Decisões sobre competência e foro eleito

Durante a análise do caso, a relatora, ministra Nancy Andrighi, destacou que a petição inicial foi distribuída antes da alteração na legislação e, embora o contrato tenha designado um foro que não se conectava com as partes, esse foro deve ser mantido. No caso em questão, uma ação de execução foi proposta em uma comarca do Mato Grosso do Sul, contudo, em decorrência da alegação de incompetência apresentada pelo réu, o juiz transferiu o processo para uma vara na capital de São Paulo, em razão do foro estipulado no contrato. O juiz paulista, ao se basear na nova redação do artigo 63 do CPC, considerou a escolha do foro como aleatória e reconheceu de ofício sua incompetência, levando o caso ao STJ.

Critérios legais na escolha do foro

A ministra Nancy Andrighi explicou que o parágrafo 1º do artigo 63 do CPC, após a nova redação, estabelece que o foro escolhido deve estar relacionado ao domicílio ou residência de uma das partes, ou ao local da obrigação, exceto nos contratos de consumo, onde deve ser mais vantajoso para o consumidor. Ela ressaltou que, caso esses critérios não sejam respeitados e um foro aleatório seja escolhido, o juiz poderá declinar da competência de ofício, conforme indicado pelo parágrafo 5º do mesmo artigo. A relatora ainda mencionou que as partes têm a liberdade de negociar e escolher o foro que mais lhes convém, desde que dentro da legalidade e evitando escolhas abusivas.

Com a promulgação da Lei 14.879/2024, Nancy Andrighi reconheceu que a Súmula 33 do STJ foi parcialmente superada, pois agora é viável que o juiz declina da competência de ofício em situações específicas, porém é fundamental que se observe o disposto no artigo 10 do CPC. A ministra destacou que o juiz deve proporcionar às partes a oportunidade de se manifestarem e defenderem uma possível ausência de abusividade na cláusula acordada, a não ser que a aleatoriedade do foro seja evidente e não haja prejuízo para as partes com a declinação.

Ao afirmar a competência do juiz de São Paulo, a relatora confirmou que a propositura da ação (o marco temporal para determinar a competência) ocorreu antes da vigência da Lei 14.879/2024, tornando inadequada a declinação de ofício da competência. A ministra enfatizou que a modificação no CPC deve ser aplicada apenas aos processos que tiveram início após sua vigência, em razão da interpretação dos artigos 14 e 43 do CPC, onde a competência será definida no momento do registro ou da distribuição da petição inicial.

A ministra Nancy Andrighi também mencionou que o STJ já entendia há anos que era possível afastar a cláusula de eleição de foro quando considerada abusiva, dificultando ou inviabilizando o acesso ao Judiciário. Ela apontou que, mesmo antes da Lei 14.879/2024, o tribunal já não permitia a escolha aleatória de foro em ações individuais originadas de sentenças coletivas, a fim de respeitar o princípio do juiz natural.

Leia o acórdão no CC 206.933.

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