A polêmica envolvendo o ministro Alexandre de Moraes e sua suposta utilização do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)
A polêmica que dominou as discussões desta semana foi a respeito do ministro Alexandre de Moraes e sua suposta utilização do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para embasar investigações conduzidas no Supremo Tribunal Federal (STF). Os meios político e jurídico têm debatido intensamente sobre as mensagens trocadas entre Airton Vieira, juiz instrutor do gabinete de Moraes no STF, Marco Antônio Vargas, juiz auxiliar de Moraes durante sua presidência no TSE, e Eduardo Tagliaferro, então chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação (AEED), órgão que era subordinado a Moraes na corte eleitoral, e as implicações jurídicas dessas trocas de mensagens.
A legalidade das ações do ministro Alexandre de Moraes
Diante desse contexto, surge a pergunta: o ministro Alexandre de Moraes agiu de forma ilegal? O gabinete de Moraes afirmou que todos os procedimentos foram oficiais, regulares e devidamente documentados nos inquéritos em andamento no STF, com a participação integral da Procuradoria-Geral da República. Durante uma sessão do STF, Moraes ressaltou que, naquele momento, o caminho mais eficiente para a investigação era a solicitação de relatórios ao TSE, uma vez que a Polícia Federal colaborava pouco com as investigações. Ele ainda afirmou que seria incoerente e contraditório se auto-oficiar, visto que era o presidente do Tribunal Superior Eleitoral na época.Para avaliarmos se houve ilegalidade ou não, é necessário analisar o papel desempenhado por Alexandre de Moraes no Inquérito 4781, instaurado em 14 de março de 2019, para apurar possíveis crimes contra a honra de ministros do STF, mas que teve seu escopo ampliado para investigar os fatos ocorridos em 8 de janeiro de 2023.O Regimento Interno do STF, em seu artigo 43, estabelece que o ministro da Corte pode atuar como autoridade investigadora em infrações penais cometidas na sede ou dependência do Tribunal. Dessa forma, a atribuição de conduzir a apuração ao ministro Alexandre de Moraes, assim como as medidas investigativas por ele determinadas no exercício dessa competência, estão em perfeita concordância com o que o regimento da corte prevê.As determinações feitas pelo ministro durante o inquérito, com o objetivo de esclarecer e investigar os fatos, são completamente legais. Não há problema algum em incluir outros elementos de informação obtidos durante a investigação no relatório elaborado pelo TSE.No entanto, a atuação de Moraes vai além da condução das investigações. Ele deferiu medidas constritivas, como prisões cautelares, e julgou os eventuais investigados. Esse é o ponto problemático. Moraes atuou tanto como órgão de investigação quanto como órgão julgador, o que contraria o sistema acusatório, que exige que haja separação entre quem investiga e quem julga.O criminalista Aury Lopes Júnior destaca que o sistema acusatório garante a imparcialidade e a tranquilidade psicológica do juiz que irá proferir a sentença. Ou seja, o magistrado, responsável por julgar, estará mais imparcial se estiver distante da busca das provas.Não há dúvidas de que a consolidação, nas mãos do julgador, das funções de investigar e julgar acaba afetando sua imparcialidade. Dificilmente um magistrado que atuou diretamente na condução das investigações, determinando diligências, consegue preservar sua imparcialidade.Essa discussão toda poderia ser minimizada se o Supremo Tribunal Federal, nas situações previstas no artigo 43 do Regimento Interno da corte, seguisse o sistema acusatório e determinasse que o ministro responsável pela instrução das investigações não pudesse votar. No entanto, até o momento, não há qualquer orientação do STF para corrigir essa grave distorção que claramente vai contra o sistema acusatório adotado no ordenamento jurídico brasileiro.Marcelo Aith é advogado criminalista, mestre em Direito Penal pela PUC-SP e especialista em Blanqueo de Capitales pela Universidad de Salamanca.