Nos últimos meses, surgiram denúncias relacionadas às Sociedades por Conta de Participação (SCPs), que são estruturas empresariais criadas para atrair investidores, mas que, em diversas situações, geram perdas financeiras indicativas. Um caso que se destaca é o da rede de academias LiveFit, que angariou recursos para suas franquias utilizando esse modelo de sociedade, mas que atualmente enfrenta acusações de inadimplência por parte de seus investidores.
Compreendendo o Modelo SCP
A SCP é uma forma de sociedade onde um sócio ostensivo (normalmente uma empresa) realiza operações em seu nome, enquanto os sócios participantes (investidores) contribuem apenas financeiramente, sem cuidar da gestão do negócio. Embora esse modelo seja legal, surgem questionamentos sobre seu uso irregular para captação de recursos, principalmente quando se prometem retornos financeiros baseados no sucesso de operações geridas por terceiros, sem envolvimento ativo do investidor.
O Caso LiveFit e Suas Implicações
No caso da LiveFit, a academia utilizou essa estrutura para atrair investidores interessados em suas franquias, prometendo retornos financeiros proporcionais ao desempenho das unidades da rede. No entanto, a empresa não tem conseguido honrar seus compromissos, gerando apreensão entre os investidores quanto à segurança de seus investimentos.
Essa situação aponta para possíveis irregularidades na captação de recursos pela LiveFit, que poderia ser classificada como uma oferta pública de contratos de investimento coletivo (CIC). Conforme a Lei 6.385/76, os contratos de investimento coletivo são considerados valores mobiliários e, por isso, precisam seguir as diretrizes da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), incluindo registro e divulgação clara sobre os riscos envolvidos.
A CVM tem o papel de regular o mercado de valores mobiliários no Brasil e assegurar que os investidores estejam protegidos. Quando uma empresa capta recursos de investidores com a promessa de retornos financeiros fundamentados no sucesso de operações geridas por terceiros, como no caso das franquias da LiveFit, pode estar caracteriza como uma oferta pública de contrato de investimento coletivo.
A Resolução CVM 160, de 2023, estabelece regras essenciais para ofertas públicas de valores mobiliários, incluindo a necessidade de registro na CVM para que a captação de recursos seja feita de maneira regulamentada, a elaboração de um prospecto que reúna informações relevantes sobre os riscos do investimento, assim como a manutenção da transparência na comunicação com os investidores, evitando desinformações e manipulação de dados.
Possíveis Consequências e Responsabilidades
Se a LiveFit captou recursos sem atender a essas exigências legais, pode ser acusada de captação irregular, sujeitando-se a sanções da CVM, que podem incluir multas e a suspensão das atividades de captação. Além disso, a inadimplência da LiveFit em relação a seus investidores suscita a questão da responsabilidade civil dos administradores da empresa. Segundo a Lei nº 11.638/07, que revisou a Lei do Mercado de Capitais, os administradores podem ser responsabilizados por falhas na gestão e pela falta de transparência na captação de recursos.
Se for provado que os gestores da LiveFit agiram com negligência ou ocultaram informações críticas sobre os riscos envolvidos, poderão ser responsabilizados pessoalmente pela reparação dos danos ocasionados aos investidores. Com o aumento das queixas por parte dos investidores, o caso da LiveFit pode ser um marco no debate sobre o uso inadequado das SCPs para captação de recursos sem as devidas garantias legais.
Direitos dos Investidores e Papéis da CVM
Os investidores prejudicados têm o direito de buscar reparação através de ações judiciais, pleiteando a devolução dos montantes investidos e a responsabilização dos administradores. Além disso, a CVM pode intervir no caso, investigando a empresa por captação irregular e implementando sanções administrativas. Portanto, é aconselhável que os investidores busquem assistência jurídica para compreender seus direitos e as possíveis vias de recuperação de seus investimentos.
A situação da LiveFit realça a necessidade de uma regulamentação rigorosa para a captação de recursos através das Sociedades por Conta de Participação. Apesar da SCP ser um modelo legal, seu uso irresponsável pode acarretar consequentes prejuízos. A CVM desempenha um papel crucial na supervisão dessas operações, para garantir que as empresas cumpram as normas de transparência e registro, resguardando os direitos dos investidores.
É essencial que as empresas respeitem as regulamentações do mercado de capitais e que os investidores permaneçam atentos às informações disponibilizadas antes de decidirem investir. Deve-se manter vigilância em relação a possíveis irregularidades na captação de investimentos por SCPs, para evitar que situações como a da LiveFit se repitam, destacando os desafios enfrentados por investidores que confiaram em promessas de retornos financeiros e agora lutam para recuperar seus recursos.
*Jorge Calazans é advogado especialista na área criminal, conselheiro estadual da Anacrim e sócio do escritório Calazans & Vieira Dias Advogados, atuando na defesa de vítimas de fraudes financeiras.