A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não há obrigação de pagamento de indenização securitária quando, apesar de a seguradora não ter informado previamente sobre a rescisão do contrato, o segurado ficou inadimplente por um longo período antes do sinistro ocorrer.
Contexto do Seguro e Decisão do Tribunal
De acordo com o processo, um seguro foi contratado em 2016, com duração de cinco anos, mas o segurado realizou o pagamento de apenas oito das 58 parcelas acordadas. Em 2019, ocorreu um sinistro, e o segurado buscou receber a indenização.
Após a negativa da seguradora, que argumentou a falta de pagamento das parcelas, o segurado moveu uma ação de cobrança, a qual foi considerada improcedente. No entanto, o tribunal de segunda instância reformou a decisão, reconhecendo que a seguradora não comprovou ter informado previamente o segurado sobre a falta de pagamento.
Notificações e Inadimplência
No recurso especial apresentado ao STJ, a seguradora defendeu que a indenização não era devida devido ao extenso período de inadimplência do segurado. A relatora, ministra Nancy Andrighi, observou que o artigo 763 do Código Civil (CC) estabelece que o segurado inadimplente não tem direito à indenização se o sinistro ocorrer antes da regularização do débito. Contudo, ela lembrou que a Segunda Seção entende que a inadimplência deve ser precedida de notificação ao segurado.
Esse entendimento está respaldado na Súmula 616 do STJ, que afirma que a seguradora deve pagar a indenização se não houver notificação ao segurado sobre o atraso nos pagamentos. A ministra argumentou que tal regra visa evitar desvantagens excessivas ao segurado em atraso, de maneira equilibrada e razoável.
A relatora ainda ressaltou que o STJ tem feito exceções à aplicação da súmula em casos de inadimplência prolongada, desde que a seguradora não tenha conseguido notificar o segurado sobre a rescisão unilateral do contrato. Ela destacou que não existe um prazo específico de inadimplência que possa levar a essa exceção, sendo necessário avaliar cada situação individualmente.
Além do tempo de inadimplência, outros fatores devem ser considerados, como o início da vigência do contrato e as condições pessoais do segurado.
Princípio da Boa-fé
Ao dar ganho ao recurso da seguradora, a ministra enfatizou a importância do inadimplemento significativo do contrato, dado que o segurado pagou apenas as primeiras oito parcelas e deixou de realizar pagamentos por 23 meses até o sinistro. Também sublinhou que, sendo uma pessoa jurídica, o segurado possui conhecimentos técnicos para gerenciar suas obrigações contratuais.
A relatora reafirmou que, mesmo sem a comunicação sobre a inadimplência, aceitar o pagamento do prêmio sob essas circunstâncias negaria os deveres de boa-fé esperados na relação contratual. “Respeitando o princípio da boa-fé, não se pode aceitar que a Súmula 616, que visa proteger o consumidor, seja usada de forma inadequada, prejudicando o equilíbrio contratual e a confiança entre as partes”, concluiu.
Consulte o acórdão no REsp 2.160.515.