A ação penal no Brasil pode ser classificada, em regra, como pública ou sigilosa. De acordo com o princípio da publicidade dos atos processuais previsto na Constituição Federal, a restrição ao caráter público dos processos só é justificável para proteção da intimidade ou em prol do interesse social. Porém, na prática forense, é comum encontrarmos diversas ações criminais em tramitação sob segredo de justiça, o que pode dar a impressão de que o sigilo é a regra e não a exceção.
As diferentes razões para o sigilo processual
Diversas explicações podem ser apontadas para esse quadro, incluindo a amplitude dos termos intimidade e interesse social como requisitos constitucionais para a ação ser tratada como sigilosa. Em determinados processos, como os de crimes sexuais, o sigilo processual pode estar relacionado à necessidade de preservar a intimidade da vítima. Já em casos que envolvem informações protegidas constitucionalmente, como quebras de sigilos bancário ou fiscal, também é comum haver sigilo. Adicionalmente, o segredo pode ser necessário para evitar que a publicidade coloque em risco a colheita de provas.
É papel da Justiça avaliar a pertinência do sigilo nos autos, considerando as particularidades de cada caso. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se posicionou em diversas situações envolvendo restrição à publicidade em casos criminais, seja para mantê-la, seja para afastá-la.
O sigilo dos dados processuais e os direitos envolvidos
O sigilo dos dados processuais não é um direito absoluto dos envolvidos. Além do princípio constitucional da publicidade dos atos processuais, o artigo 93, inciso IX, da Constituição também estabelece que todos os julgamentos do Judiciário sejam públicos, com possibilidade de limitação da publicidade apenas para a prática de determinados atos, desde que não prejudique o interesse público à informação.
O sigilo, portanto, é uma situação excepcional que deve passar pelo crivo da ponderação dos princípios constitucionais, levando em consideração as particularidades do caso concreto. Em um caso analisado pelo STJ, os réus argumentaram que a decretação do sigilo era necessária para a proteção de sua segurança e para evitar a devassa pública de suas vidas, mas o tribunal considerou que esses argumentos não eram suficientes para afastar a regra da publicidade processual.
Em outro caso, envolvendo crimes contra a dignidade sexual, o tribunal decidiu que a sessão do júri poderia ser realizada sem a presença do público, levando em consideração a preservação da imagem e da dignidade da vítima.
A identificação do nome do réu em ação penal não viola o direito à intimidade, segundo entendimento do STJ. Em um processo sobre crime de divulgação de pornografia infantil, o tribunal decidiu que a regra constitucional da publicidade se sobrepõe à possibilidade de restrição do acesso às informações processuais em ações sigilosas.
Por fim, é importante ressaltar que quaisquer questionamentos sobre a aplicação do sigilo devem ser feitos no momento adequado do processo. No caso de um habeas corpus analisado pelo STJ, a defesa alegou nulidade da ação penal por tramitar indevidamente sob segredo de justiça, porém, como não impugnou essa questão durante as fases do processo, a relatora considerou que houve preclusão da matéria.